Nenhum serviço é criado no vácuo. Todo serviço é, por definição, uma rede de relações — entre pessoas, sistemas, contextos, canais e expectativas. Diante disso, pensar o design de serviços como um ato isolado, restrito a uma área ou disciplina, é uma visão limitada. O design de serviços nasce e evolui da intersecção entre diferentes especialidades, olhares e repertórios.
Mais do que uma tendência, a colaboração interdisciplinar é uma condição para a criação de experiências completas, humanas e sustentáveis. Afinal, como criar algo que funcione, seja desejável e viável, se olhamos o problema apenas sob um único ponto de vista?
Neste artigo, vamos explorar por que a colaboração interdisciplinar é uma peça-chave no design de serviços, como ela impacta a inovação e a experiência do usuário, e o que fazer para promovê-la de forma estruturada e estratégica.
A Complexidade dos Serviços e o Papel da Interdisciplinaridade
Serviços envolvem sistemas complexos. Um atendimento bancário digital, por exemplo, pode parecer simples para o usuário, mas por trás há uma estrutura que combina:
- Engenharia de software e dados
- Arquitetura de informação
- Design de interação e conteúdo
- Atendimento humano
- Regras legais e regulatórias
- Infraestrutura operacional
Cada uma dessas partes tem um papel fundamental. E a má notícia é: se apenas uma delas falha, a experiência toda se compromete.
Por isso, a integração entre disciplinas é essencial. Um bom serviço não nasce da soma de soluções isoladas, mas da orquestração de saberes complementares em torno de um mesmo objetivo: atender bem às necessidades reais das pessoas.
O que a Colaboração Interdisciplinar Traz para o Design de Serviços
1. Diagnóstico mais preciso dos problemas
Profissionais com formações diferentes enxergam o mesmo desafio com lentes distintas. Essa pluralidade de visões enriquece o entendimento e permite identificar causas e oportunidades que uma única área talvez ignorasse.
2. Soluções mais criativas e completas
De acordo com o Interaction Design Foundation, a criatividade acontece quando ideias distintas se encontram. Um time com diversidade disciplinar tende a gerar soluções mais originais e viáveis, pois cruza conhecimentos técnicos, sensíveis e contextuais.
3. Redução de riscos na implementação
Projetos interdisciplinares envolvem desde o início os responsáveis pela viabilidade técnica e pela operação. Isso evita retrabalho e acelera a execução das ideias.
4. Melhoria contínua da experiência do usuário
Quando áreas como UX, engenharia, marketing e atendimento colaboram, criam jornadas mais consistentes e integradas. Isso reduz ruídos e aumenta a satisfação do cliente final.
Exemplos de Colaboração Interdisciplinar que Transformaram Serviços
Airbnb
Desde o início, a empresa adotou uma abordagem profundamente colaborativa, integrando designers, engenheiros e profissionais da área de hospitalidade. O resultado foi a criação de uma experiência que equilibra funcionalidade, empatia e personalização.
Google Maps
Desenvolver um serviço como o Google Maps exigiu não apenas engenheiros, mas também especialistas em geolocalização, urbanismo, UX writers e designers. Essa integração garantiu uma ferramenta robusta e acessível a bilhões de usuários.
Hospital Israelita Albert Einstein
No Brasil, o hospital é referência em aplicar design de serviços à saúde. Em seus projetos, colaboram médicos, enfermeiros, designers, pacientes, familiares, psicólogos e administradores para repensar jornadas e protocolos de atendimento.
Como Estimular a Colaboração Interdisciplinar no Dia a Dia do Design
A colaboração interdisciplinar não acontece por acaso. Ela precisa ser cultivada intencionalmente. Algumas ações práticas incluem:
1. Comece pelo problema, não pela solução
Evite briefings fechados ou soluções pré-definidas. Traga o desafio real, crie um ambiente seguro para perguntas e permita que diferentes vozes ajudem a moldar a abordagem.
2. Promova rituais de cocriação
Use dinâmicas como mapas de jornada, painéis de ideação, sprints colaborativos, Crazy Eights e Service Blueprints. Essas ferramentas permitem que todos contribuam, mesmo sem domínio técnico em design.
3. Crie uma linguagem comum
Cada área tem seu jargão. Um passo essencial para a colaboração é criar mapas visuais, metáforas e protótipos que traduzam ideias de forma acessível. Prototipar não é desenhar uma interface — é tornar o invisível tangível.
4. Valorize escuta ativa e empatia entre colegas
O design centrado no usuário começa dentro da equipe. A empatia entre disciplinas é o que permite a construção de confiança, abertura ao erro e aprendizado compartilhado.
Barreiras Comuns (e Como Superá-las)
Colaboração entre áreas diferentes não é isenta de desafios. Entre os mais comuns estão:
- Desalinhamento de objetivos: quando áreas têm metas conflitantes, o projeto sofre. Solução: criar um objetivo comum e alinhado com a experiência do usuário.
- Hierarquia de saberes: quando uma área se considera mais “importante” que a outra. Solução: prática intencional de equidade e valorização de saberes diversos.
- Falta de tempo e recursos: integração dá trabalho. Solução: priorizar qualidade colaborativa na fase inicial do projeto, onde o impacto é maior.
Nenhum Designer é Uma Ilha
Projetar serviços é um trabalho de fronteiras. De fronteiras entre disciplinas, entre áreas da empresa, entre o que é visível e o que está por trás do palco.
A colaboração interdisciplinar no design de serviços não é um luxo, mas uma necessidade. Somente unindo especialistas em diferentes linguagens — técnica, emocional, visual, operacional — é que conseguimos criar soluções que façam sentido, funcionem e emocionem.
Para isso, o design precisa deixar de ser um território fechado. E se tornar um campo aberto de encontros, escutas e sínteses. É ali, nesse entrelaçamento, que nasce o verdadeiro valor do serviço.
Se queremos mudar a experiência do cliente, precisamos antes transformar a experiência da equipe que o serve. E isso começa pela colaboração.